domingo, 30 de setembro de 2012

União Europeia: Unir o que a crise separou




A construção da UE assemelhou-se, até a um certo ponto, a um bom casamento. Foi feita com base em cedências mútuas, com acordos que pretendiam salvaguardar a integração europeia. Falo sim, por muito polémicos que tenham sido, dos fundos europeus que permitiram desenvolver Portugal (e outros países periféricos) e aproximá-los do resto de Europa. Apesar de ter havido alguma má gestão dos recursos fornecidos, houve sem dúvida uma grande evolução económica.

Esse casamento teve o seu primeiro grande abalo económico depois da adopção do euro. O Sul, desejoso de fugir à pobreza que o marcava desde o século XVII, viu nas condições fornecidas pela moeda única uma maneira fácil de escalar até ao topo. Juros baixos e uma moeda forte prometiam mundos e fundos. Perigosa ilusão. Os países endividaram-se e não conseguiram resistir ao teste de fogo, que foi a crise mundial em 2008, com a inevitável pressão dos mercados.

A questão põe-se: porque é que a crise afectou especialmente a Europa? A resposta é assustadoramente simples. Porque, e como explica George Soros, o problema da Europa seria antes político que económico. Em tom proverbial: pôs-se a carroça à frente dos bois.

Deu-se então a divisão da União. Credores e devedores. Norte e Sul. Surge outra pergunta. Como desfazer este nó górdio? A solução está onde sempre esteve. Em Berlim e Bruxelas.

 Em Berlim, porque este é o líder natural desta União. Os alemães conhecem bem as suas forças, mas também estão cientes das suas limitações. Demasiado grandes para a Europa, demasiado pequenos para serem um grande actor mundial. Precisam da Europa e, verdade seja dita, a Europa precisa deles. Aos alemães cabe grande parte do poder e com esse, já dizia o tio do homem-aranha, vem grande responsabilidade. A Alemanha deverá abdicar da sua taxa de juro negativa e mutualizá-la. Tem também que convencer os restantes países credores a acompanhá-los.

Quanto aos devedores, terão que aprender a racionalizar. A verdade é que a austeridade é um caminho inevitável. Quem o nega ou é ignorante ou demagogo. Não creio contudo que haja o famigerado moral hazard, por parte dos países devedores. O perigo moral de os países voltarem ao “regabofe” é infundado. Esta amostra das consequências de certos desmandos já terá sido suficiente. Sei contudo, que tal acordo tácito não será suficiente para sossegar alemães, finlandeses ou holandeses. Sim, julgo que será necessário controlo orçamental por parte de Bruxelas.

E é precisamente a Bruxelas cabe a coordenação de todo este processo. A cura desta desunião europeia é tarefa hercúlea, mas possível. Exigirá perseverança e coragem, por parte dos líderes europeus. Não será feita da noite para o dia. Pedirá ao BCE que aja, descansando os mercados, enquanto as verdadeiras reformas são feitas. Os países devedores terão que ser austeros (q.b. claro); e os credores solidários.

Tudo isto é necessário para salvar um casamento promissor e um projecto ambicioso. Mas, antes de mais, há uma palavra que se impõe: Democracia.

domingo, 23 de setembro de 2012

Economia: Dois caminhos para o suicídio



Já referi, a alguns posts a esta parte, que nos encontramos num momento muito sensível da nossa vida política (abrangendo os últimos anos); temos um governo politicamente fragilizado, no meio de uma situação económica caquéctica.

Neste ponto os extremos tocam-se.

Uns - mais ligados aos sectores da extrema-esquerda - apontam um só caminho para solucionar a crise: mandar a Troika bugiar, pegar nas malinhas e zarpar.

Outros - nomeadamente o grupo ideologicamente afecto ao cumprimento do memorando  e da acepção que é possível ir mais além dele – querem cumpri-lo, revê-lo e, mesmo assim acreditam que, depois de destruído todo o paradigma económico vigente, será possível construir um sólido edifício sob as suas ruínas.

Vamos por partes.

Aos primeiros, membros afectos a movimentos comunistas, anarquistas e bloquistas (estes últimos uma mistura dos dois atrás e mais um ou dois ingredientes); devo relembrar-lhes as consequências de um default. Já nem pergunto como é que estes iluminados arranjariam o financiamento externo imprescindível à capitalização das nossas pequenas e médias empresas.

Relembro que o país que mais se aproxima de um total fecho aos mercados internacionais é a Coreia do Norte (e mesmo esta tem negócios no estrangeiro). É isto que querem para Portugal? Acredito que para alguns seria um bom exemplo de “desenvolvimento”.

Mas as consequências imediatas de uma quebra do contrato com as entidades externas trariam agravantes que os insensatos incentivadores à quebra do memorando não se recordam (ou não querem recordar). Portugal entraria em default (incumprimento), isso é certo! E consequências? Aqui estão algumas:
  • Nova moeda
  • Salários desvalorizariam (estimativas mais animadoras apontam para uma quebra de 30%)
  • O Governo teria de nacionalizar todos os bancos (já que se tornariam insolventes) e proibiria o levantamento de dinheiro
  • Teria de ser imposto um recolher obrigatório, dado que a contestação nas ruas subiria para níveis nunca antes vistos.

Do outro lado do espectro ideológico estão aqueles que querem e desejam ir mais além do memorando. Ao contrário dos primeiros, estes últimos têm mais poder visto que se encontram, actualmente, no Governo. Os resultados desta política são, até ver (e acho que já todos vimos o que tinha que ser visto), inconsequentes e contraproducentes. O desemprego está a roçar os 17% da população activa, as medidas de austeridade ameaçam levar grande parte dos salários e, apesar disto tudo, o défice teima em ser mal-comportado e não responder de acordo com o que está estipulado com o ficheiro Excel armazenado no portátil de Vítor Gaspar. Nem o FMI se revê nesta austeridade cega.

Tudo isto é embrulhado numa retórica estupidamente darwinista de que os portugueses se habituaram a ser preguiçosos; para isso se cortam feriados e se flexibiliza o mercado de trabalho (esta última medida nem seria má de todo, não fosse o desemprego crónico dos últimos anos). Os portugueses, vistos com sobranceria pelos governantes, são tomados com preguiçosos ambulantes.

Perguntam-me se há outro caminho? Sim, há! Não envolve renegar a troika, mas sim negociar com ela. Baixar os juros, rever temporalmente as metas acordadas e algumas medidas. O memorando não é todo um “pacto de agressão” (como fazem crer alguns). Tem medidas necessárias. Destaco duas: reforma da justiça (a falta de celeridade da justiça portuguesa era calamitosa) e o famoso corte nas gorduras no Estado.

Por isso sim, há alternativas e soluções. O resto são caminhos para o suicídio económico!

sábado, 22 de setembro de 2012

Relações no séc. XXI: crise de valores ou evolução natural?



O príncipe que lutava contra o dragão para salvar a sua bela adormecida morreu. O sonho do amor eterno que fazia pulsar o coração feminino sustentado por um cavalheiro servil - que se curvava diante da sua deusa e proferia palavras de amor - entrou em declínio. E porquê?

Os sociólogos afirmam que vivemos numa época onde o culto de relacionamentos apaixonados promove a falta de responsabilidade diante das crises naturais de toda e qualquer relação; homens e mulheres queixam-se da banalização do sexo e dos encontros – que raramente acontecem – mas que tanto anseiam; e o número de divórcios cresceu exponencialmente – apontando as tendências para um aumento contínuo.

Vivemos num período conturbado, é certo, mas tudo isso é fruto do natural desenvolvimento do ser humano. Para compreender todo esse desencontro amoroso é necessário atender às mudanças sociais e culturais e aos novos desafios e paradigmas que os relacionamentos enfrentam.

Se no passado era necessário um verdadeiro ritual até o homem ousar aproximar-se da mulher, tocá-la e, muito depois, conseguir o primeiro beijo, actualmente a velocidade e a forma de se relacionar estão completamente alteradas.

Com a maior independência das mulheres, a quebra de tabus e preconceitos e o advento da internet verificou-se uma completa mudança comportamental na sociedade em torno do que antes era tão trabalhoso.

Pode-se argumentar que outrora as pessoas procuravam conhecer-se antes de assumir um relacionamento e que agora as coisas se perverteram, assumindo as relações uma velocidade tal que a sua superficialidade aumentou exponencialmente.

Mas como inverter este padrão quando conhecer um novo parceiro está hoje à distância de um clique e namorar à distância de uma sms?

Se as relações hoje estão mais vulneráveis e mais egoístas, estão também mais transparentes.

Certos aspectos da personalidade que antes ficavam ocultos podem agora emergir sem receios, já não há a obrigação moral de reger os relacionamentos por estereótipos e os “casamentos por encomenda” são raros. Pode-se afirmar que as relações modernas transpiram mais individualidade.

Então, o novo conceito de “Alma Gémea” pode ser o de duas individualidades que partilham afinidades e estabelecem uma relação de respeito, cumplicidade e intimidade mútua. Algo bastante diferente da típica rigidez e subserviência dos relacionamentos do passado.

É inútil tentar preservar um status quo quando este não é aplicável à nossa realidade. O individualismo deve ser, com os seus prós e contras, a questão-chave a ser trabalhada nos relacionamentos modernos.

Por tudo isto, volto a dizer: O príncipe que lutava contra o dragão para salvar sua bela adormecida morreu. A história terá de ser reescrita para incluir elementos como as redes sociais ou a emancipação da mulher, e condicionantes como a preponderância dos objectivos profissionais, a rotatividade nos relacionamentos, os desencontros amorosos e a procura da individualidade nas relações.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Procura-se mudança. Não à TINA!




A Política (com P maiúsculo) é no seu cerne a arte de estabelecer pontes e conseguir compromissos. Os Políticos (continuo com a letra grande) têm a confiança da população depositada nas suas mãos, com o objectivo de conseguir encontrar soluções e propor alternativas nas condições mais adversas.

Por isso, chegando a um ponto que nos apontam o futuro com a sigla TINA (There is no Alternative), bem podemos dizer que a Política morreu. Ponto final. Finito. Encomende-se a missa e mande-se flores. Não, não pode ser assim. Desde tempos imemoriais que a Política subsiste, não interessa que crises se criem ou que obstáculos se imponham. Podia ir aos primórdios da raça humana; onde se começaram a definir hierarquias ou podia ficar-me pela Grécia Antiga, tempo em que a Política, na verdadeira acepção da palavra dava os primeiros passos sob a batuta dos teóricos Péricles e Aristóteles.

Tudo para dizer que há – com certeza que há – alternativa à austeridade violenta e inconsequente. Tolos serão aqueles que rejeitam por completo a austeridade: há que expiar “pecados” do passado; ainda que essas mágoas passadas tenham advindo de um período de deslumbramento (o tal período de acesso ao crédito fácil dos anos 90 e primeira década do milénio). Mas esta austeridade, completamente inconsequente e até contraproducente, não é a alternativa. A economia ressente-se; o desemprego dispara e a recente austeridade adivinha-se como sendo a gota no copo de água (falo, por exemplo, do aumento da TSU para os trabalhadores). Há estudos que indicam que esta medida, apresentada pelo Governo como forma de estancar o desemprego – note-se que falo em estancar e não inverter: não passam de cuidados paliativos – pode tero efeito contrário e criar mais desempregados

A extrema-esquerda, que cresceu – sem surpresa – nas sondagens efectuadas após o anúncio destas novas medidas; parece querer (ou exigir) o melhor dos dois mundos. Ficar no euro, manter o financiamento externo (imprescindível) e renegar quaisquer tentativas de consolidação das contas. Certo é que pedem uma auditoria à dívida; e também é verdadeiro que houve negócios que agravaram o défice e que pouco favorecerem a população – e logo podem ser considerados dívida odiosa – como é o caso dos submarinos e do BPN. Mas é importante não entrar em demagogias e saber ver que tivemos tempos de desbarato, que se reflectiu a nível micro e macro económico.

O maior partido da oposição – o PS – precisa de sair do casulo. Se se quer assumir como uma alternativa tem que sair do casulo. Não bastam anúncios dramatizados, cujo resultado palpável seja um imposto duvidoso sob as PPP´s. É preciso mais. Honra lhe seja feito Seguro tem lutado no Parlamento para comprometer o Governo com soluções europeias. As questões da compra de dívida por parte do BCE e do baixar da taxa de juro do empréstimo da Troika, são/foram bandeiras dos socialistas. É preciso mais que isso. Os portugueses precisam de ver no PS, um partido que quer fazer mudanças estruturais, que não quer insensatamente expulsar as entidades externas (e consequentemente o financiamento); mas que também se imponha face à Troika e que saiba travar este empobrecimento generalizado.

Em suma admitir que não há alternativas é baixar os braços e enfrentar o Fim da História. Se o desenvolvimento do ser humano foi feito, até aos dias de hoje, com base na procura de alternativas, quem somos nós para pormos fim a esse rumo? Fukuyama previu aquando da queda do muro de Berlim e o colapsar do mundo comunista; o Fim da História. Falhou. Os que apostam num só caminho também vão falhar. Afinal têm que haver alternativas.

Uma mente brilhante

terça-feira, 18 de setembro de 2012

15 de Setembro: Fim aos manifestantes em part-time!



Há um paradigma há muito estabelecido na sociedade moderna – que se reflecte principalmente nos jovens e que se tem perpetuado – há uma demonização da Política e de tudo o que a envolve. Hoje em dia, a actividade política é vista como algo bolorento e longínquo.

Certo é que a culpa não será toda do cidadão comum. Há muito que a Política (e a Economia: são termos umbilicais), foi tomada por experts, debitando termos e definições que escapam ao simples mortal. A Política também foi tomada por oportunistas, movidos por ambições pessoais que descartam o principal objectivo desta nobre actividade: servir a comunidade.

Mas estes “cidadãos” que agora gritam slogans antipolíticos não podem demarcar-se das suas responsabilidades. Carregam também o fardo de terem deixado de exercer o escrutínio sob os responsáveis que decidem o futuro de nós todos como sociedade. Poderia dar o exemplo da crónica abstenção que marca a ida (ou não ida) às urnas. Mas, verdade seja dita, a cidadania passa por muito mais que isso. Envolve (ou deveria envolver) um debate diário, uma participação cívica activa e uma indagação permanente. Isso não acontece. É mais fácil encontrar refúgio no mote: “Eles são todos iguais”.

Não partilho do entusiasmo resultante das grandes manifestações. Infelizmente, e a história mais recente mostra-nos isso, tudo não passará de um escape para uma raiva acumulada. É para mim incompreensível que haja ainda pessoas que depois de uma grande manifestação se desloquem ao centro comercial mais próximo e se entreguem à gula consumista. É como se tudo não se tivesse passado de um grande chá das cinco e que, depois de aplacada a fúria, se volte à rotina diária.

Importa relembrar que este sentimento antipolítico marcou a ascensão ditatorial de Salazar ao poder. As pessoas, cansadas da instabilidade que marcou os anos de republicanismo, procuraram relegar as responsabilidades numa figura paternal que não lhes fizesse muitas perguntas e não suscitasse muitas dúvidas. Este egoísmo cívico, bem presente nos desabafos salazaristas (Cito de cor: “Se as pessoas soubessem o que custa mandar, limitar-se-iam a obedecer”) levou a que o povo português estivesse amordaçado por 40 anos. Não queiramos repeti-lo.

Chegamos a um ponto sem retorno. Por incompetência dos nossos governantes, é certo, mas sobretudo pela nossa cumplicidade com essa negligência. O caminho não é o “antipolítico” – isso seria a abolição da própria cidadania – mas sim a uma intensificação da participação de cada um. Afinal, como nos lembra o Padre António Vieira, não há coisa que causa maior apetite à natureza humana “que a notícia dos tempos e sucessos futuros”. Não é disto que se trata a Política?

Por isso, é importante inverter esta tendência anti natura, de descomprometimento total com os nossos futuros. A manifestação de 15 de Setembro é um marco, ninguém tem dúvidas disso. Mas é, antes de mais, conclusiva de que só acordamos quando a “noite mais triste” (relembrada nos versos intemporais de Manuel Alegre) já vai cerrada. A democracia é como um ser vivo, se não for cuidada e acarinhada definhará. Por isso é importante dizer, ainda que isso doa a alguns: precisamos mais de democratas assíduos do que de manifestantes em part-time!

Post Scriptum: A solução para este problema não será milagrosa e imediata, mas lá fora já começam a aparecer alternativas para este novo desafio que se impõe à democracia. Na Bélgica, país "desgovernado", haverá a 11 de Novembro uma conferência, ironicamente apelidada de G1000 Citizens Summit, onde 1000 cidadãos irão debater os problemas de nação e, esperançosamente, tentarão encontrar soluções. Por cá, começam-se a organizar movimentos cívicos ainda muito pouco maduros. Espero (e lanço aqui o desafio) que cada um de nós se envolva mais activamente em grupos de debate e em think-thanks que proponham alternativas ao sistema falido em que vivemos.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Política: Há algo mais urgente do que resolver a crise europeia?


“O autismo é uma disfunção global do desenvolvimento. É uma alteração que afecta a capacidade de comunicação do indivíduo, de socialização (estabelecer relacionamentos) e de comportamento (responder apropriadamente ao ambiente — segundo as normas que regulam essas respostas)”. Esta é a definição que nos dá a Wikipedia, fonte completamente rudimentar e com uma fiabilidade semelhante às promessas de Passos em campanha eleitoral.
Mas, ainda que a definição Wikipedista não seja a melhor, parece-me ser evidente que Passos padece desta maleita. O facto de não ouvir as vozes que se levantam de todos os lados é algo preocupante e o primeiro-ministro deveria procurar ajudar especializada. Ou talvez se trate de um qualquer mecanismo de auto-defesa. Não sei, não sou psiquiatra.
Já nem falo da manifestação de 15 de Setembro. Passos escolheu ignorá-la, com certeza temendo que o poder caísse na rua se o fizesse. Não Pedro (o político, não o pai): não se trata de dar o poder à “turba”, mas sim de a ouvir. Não te esqueças que a população é pilar fundamental de um Estado de direito. Ignorá-la é negligente, insensato e…perigoso. Portas, que é um animal político, já vai dando sinais de que as coisas não se tratam como estão a ser tratadas.
Aproveito para falar de outra “manifestação”, outro pequeno acto de protesto que Passos escolheu ignorar. Digo pequeno, mas arrisco-me a dizer que é de uma importância maior do que as manifestações de 15 de Setembro (perdoem-me os manifestantes, mas isto é uma consequência do mundo globalizado e, para nós, europeizado em que vivemos). Falo de uma pequena reunião que Mario Monti organizou e que contará com a presença do primeiro-ministro espanhol (Rajoy), com a presença do líder do governo grego (Samaras) e com o primeiro-ministro irlandês Enda Kenny.
Serão estes nomes, anteriormente apontados, perigosos comunistas? Não, nada disso. Como sabemos, Mario Monti é um tecnocrata e os outros três governantes são de partidos ideologicamente alinhados com o centro-direita (da mesma família política do PSD). E por falar em PSD. Que fez Passos? Optou por declinar o convite alegando motivos de agenda. Eu não conheço a agenda de Passos, mas deixo aqui o repto aos seus assessores: há algo mais urgente do que resolver a crise europeia?

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Austeridade: E depois da encruzilhada?


Um dia haveríamos de chegar a este ponto. As medidas de austeridade, apresentadas e consolidadas, destruíram algo que ainda nos diferenciava da Grécia (fora a imagem de bom aluno): o consenso social em torno programa de ajustamento económico. Algo que nem a Espanha se dá ao luxo de ter!

A partir desta encruzilhada é bom fazer um exercício de reflexão (que poderá perfeitamente não se tornar real, dada as condições anormais em que vivemos), e tentar discernir que saídas há para os principais líderes políticos e parceiros sociais.

O que se passa com Passos é claro. Perdeu (se é que alguma vez as teve) as rédeas do partido. Com Relvas caladinho, o PSD abandonou (como seria de esperar) a retórica do “que se lixem as eleições”. A avaliar pelo que dizem os principais barões e figuras secundárias do partido, o mote agora é: que se lixe o Passos! Pois é, as autárquicas não tardam e todos os presidentes de junta e de câmara têm que fazer pela vida. Os abraços sinceros dos tempos de Sá Carneiro, tornaram-se em cínicas palmadinhas nas costas. Os barões não dormem e os abutres já sentem o cheiro fétido a carne moribunda.

Para Portas e o CDS é o agora ou nunca. Paulo Portas, o parceiro de coligação que nem o diabo quer ter, vai ter que decidir se apoia ou não este governo. Avança o Público, na edição em papel (14-09-2012), que o CDS se prepara para sair, depois de aprovado o OE. Isso não o livrará do ónus da culpa de ter ajudado a passar as medidas de austeridade. A sair, Portas deveria sair agora. E depois, se as coisas derem para o torto (como irão dar!), dizer: eu não tive nada que ver com isto, só fui até onde tinha que ir. Mas Portas, atenção! Antes de te precipitares, olha para a Holanda: Geert Wilders fez o mesmo que tu! Abandonou a coligação quando o governo anunciou mais medidas de austeridade. As urnas não o pouparam.

Já o PS encontrou aqui uma janela para fazer o que foi talhado para fazer: oposição. Sim, o PS assinou o memorando. Mas, verdade seja dita, o PS nunca se comprometeu a ir além dele. Aliás é sabido (pelo menos o Catroga disse-o) que o memorando é mais obra do PSD de que do PS. Agora: ao apresentar soluções, que sejam assertivas.

Bloco de Esquerda e PCP tem que se limitar a capitalizar o descontentamento. Por irónico que possa parecer, as alturas de crise são boas para estes partidos. É um momento crucial também para o Bloco de Esquerda. Ou se assume como alternativa credível, ou se afunda no esquecimento que só a política é capaz de conseguir.

Quanto aos parceiros sociais uma palavra para a UGT: só poderá romper com o Acordo Tripartido que fez com o Governo e CIP. Caso contrário, arrisca-se a desaparecer e fica a CGTP estabelecida como a única central sindical. E isso não é bom!

O romano Júlio César, ao atravessar o rio Rubicão, sabendo que isso iria dar azo a uma guerra, proferiu a famosa frase “'Alea jacta est”. Bem, Passos atravessou o Rubicão e iniciou uma guerra. Mas Passos não é um César. Acho que nenhum deles é. De qualquer das formas, os dados estão lançados.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Austeridade: Já iam uns cursinhos de media training, não?


Não vou dissertar sobre as novas medidas de austeridade. São um assunto dissecadíssimo e, como já vimos, suscitam críticas à esquerda e à direita. No liberal e no comunista. Reprovo, sobretudo a maneira como foram anunciadas. Apercebi-me disso ao ver o Gaspar na TV. O homem fala, fala, fala e um familiar meu, depois de o ouvir comenta: “Não percebi nada do que disse!” Nem tem obrigação: é formado em letras.

O economês, que é o novo francês – tagarelice da pseudo-elite provinciana que temos – é agora mais que falado, é divinizado! Vemos por aí (basta espreitar a comunicação social) dezenas de anglicanismos incompreensíveis: hedge funds, credit default swaps, Yield… Para isto é preciso um dicionário. Não me admiro que, como vi hoje, as pessoas escolham a CARAS ao invés de um jornal com uma entrevista do Gaspar. Para ler chinês é preciso um curso.

Com tantos assessores Passos e Gaspar não conseguiam fazer melhor? E depois fora o tecnicismo do discurso, o governo não anuncia as medidas populares. Veja-se por exemplo as medidas que se “esquecerem” de referir. (Controle dos fundos remanescentes da TSU – empresas não as podem usar a não ser para investir, bens de luxo mais taxados, mais impostos sob as transacções bancárias). Não admira que no PSD se esteja em rebuliço. Passos nem para ele é bom.

Fica a pergunta: já que se deram ao trabalho de escrever uma minuta (e um post no facebook que deu borrada), não podiam dar uns cursinhos de media training ao Gaspar? Não custava nada e olha (!) até se criavam empregos.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Ensino Profissional: Para onde nos leva Crato?



A ideia de uma via de ensino com uma componente mais prática surge há mais de 12 anos e o objectivo inicial foi proporcionar a obtenção do diploma do 9º ano a alunos com historial de insucesso repetido no ensino regular e numa faixa etária que já não era abrangida pela escolaridade obrigatória. Chamaram-se a esses projectos o “9+1” , eram financiados por uma das medidas do PRODEP e foram o “embrião” para os Cursos de Educação e Formação (CEF) que, inicialmente, pouco mais eram do que medidas de combate ao insucesso escolar. Lentamente a a vertente profissionalizante foi sendo desenvolvida, e estes cursos passaram de vias de recurso para quem não era capaz de responder ao ensino regular, a verdadeiras alternativas para alunos cujo perfil se adaptava mais a um ensino vocacionado para a vida prática. Foi uma verdadeira mudança de paradigma na escola, e aqueles alunos que anteriormente se arrastavam penosamente até ao final da escolaridade obrigatória passaram a poder ingressar no mercado de trabalho com uma preparação muito mais completa.

Entretanto começaram também a surgir os cursos profissionais para o ensino secundário. Também estes foram, inicialmente mal recebidos pelos alunos pois eram conotados com o insucesso escolar mas,gradualmente essa ideia foi desaparecendo porque os formandos que optavam por esta via foram bem recebidos pelo mercado de trabalho. Em 2010 havia 65000 alunos a frequentar estes cursos (dados PORDATA) que incluem, no ultimo ano, um estágio profissional em contexto laboral, supervisionado de perto pelo Director de Curso.

Todos estes alunos estão no ensino profissional por opção e podem, se assim o desejarem, realizar os exames que permitem o acesso ao ensino superior, prosseguindo os seus estudos.
Segundo as regras impostas pelo Programa de Financiamento POPH, parte do orçamento destes cursos era destinado a equipar as escolas com as instalações e o material adequado ao funcionamento dos mesmos . É assim que surgem oficinas de serralharia mecânica, de electricidade, restaurantes pedagógicos, salas de informática, equipamento de jardinagem ou de desporto, enfim, um conjunto de recursos que são usados nos cursos profissionais mas que, sendo parte da escola, acabam também por servir o resto da população escolar.

As especificidade do ensino profissional, em que o aluno é o actor central do processo educativo obrigaram também a uma adaptação das equipas educativas. O professor/formador tem que se adaptar e torna-se mais criativo e mais flexível nas práticas pedagógicas e acaba por transportar essas novas práticas para o ensino regular, com vantagens para os alunos.

Em resumo, em 2011 os CEF e os Cursos Profissionais estão a funcionar em pleno, respondendo às necessidades dos alunos. Começava, nas escolas, a sentir-se a importância de responder às necessidades do mercado. Estava na altura de dar o passo seguinte. As escolas necessitavam de ter autonomia para procurarem, dentro do seu território educativo, parcerias com o tecido empresarial que motivassem o ajuste da oferta formativa às necessidades das empresas. Só este caminho permitiria eliminar algumas perversidade do sistema mas principalmente diversificar assertivamente a oferta formativa.

Eis senão quando entra em cena Nuno Crato e a nova equipa no MEC com promessas de aumento de autonomia das escolas e assumindo como uma das prioridades para a política educativa expressas nas Grandes Opções do Plano e inscrita no Memorando da Troika

“Alargar as oportunidades de qualificação certificada para os jovens e os adultos”

Era legítimo pensar, nesta altura, que estavam criadas as condições para um aumento da oferta de cursos profissionais nas escolas. Sabendo à partida que a escolaridade obrigatória iria ser alargada até ao 12º ano, eram boas notícias para um sistema de educação publica que se debatia já com o problema da falta de alunos.

No entanto, logo em Setembro de 2011 o Governo dá o sinal de que o caminho escolhido não seria bem este, condicionando a abertura dos curso e limitando fortemente as candidaturas das escolas ao POPH.

Foi uma surpresa. Afinal qual era o caminho escolhido? Ao longo do ano de 2012, sem nunca clarificar totalmente os objectivos, várias medidas vão sendo tomadas:

Em Janeiro de 2012 o governo assina o acordo tripartido e inicia a assinatura de diversos protocolos comAssociações Empresariais, Camâras de Comercio e empresas.

A meio do ano de 2012 termina a revisão do QREN. As verbas do POPH são deslocalizadas dasDirecções Regionais da Educação e passam para a tutela do IEFP

O ministro anuncia um aumento de 50% do número de alunos no ensino profisssional e o IEFP anuncia a abertura de 700 novos cursos em regime de aprendizagem-dual com subsidio (os formandos passam 60% do tempo no local da formação teórica e 40% em contexto empresarial, pago)

Está tudo explicadinho aqui


Começa a ficar claro que o que interessa a este governo não é a qualidade da formação. Em tempos de contenção orçamental, a preocupação nem sequer passa por rentabilizar todo o investimento feito nos ultimos anos, como provam, no inicio deste ano lectivo, as oficinas vazias de alunos e os docentes altamente especializados que o MEC deixou sem colocação. Nada disso! Com esta pequena “revolução”, Nuno Crato consegue criar uma bolsa de mão de obra barata e ainda chamar a si o mérito de baixar o desemprego jovem. Pelo caminho, haverá lugar para alguns ganharem dinheiro com os fundos comunitários com um modelo de formação semelhante ao da década de 80 que teve as consequências de má memória que todos conhecemos.

Nuno Crato já mostrou que não veio para vestir a camisola da escola pública, nem dos docentes, nem dos alunos. Fica agora claro, que o Ministério despiu completamente a camisola da educação, demitindo-se das responsabilidades que lhe cabem na construção do futuro do país.

Sandra Alves


domingo, 9 de setembro de 2012

Economia: A perversão do liberalismo



Nos tempos que correm dizer bem do liberalismo bem pode se pode assemelhar a uma blasfémia. Se não estivéssemos numa sociedade onde impera o politicamente correcto arrisco-me a dizer que eram bem capaz de ser condenado ao apedrejamento, tal e qual aquela rapariga paquistanesa acusada de queimar o Corão.

Mas, e como gosto de linchamentos virtuais, aqui vai: há uma face humana no liberalismo. Passo a explicar: como o próprio nome indica liberalismo implica liberdade. Foram liberais, os primeiros que perseguiram variadas emancipações humanas. Saliento Jonh Locke (na liberdade política) e Adam Smith (pai do liberalismo económico). Mais: o raiar do liberalismo (em associação com o iluminismo) deu-se com nomes como Voltaire (liberdade religiosa).

Como podem ver, os princípios eram bons e, arrisco-me a dizer, puros. Já no século XX, mais precisamente no pós-II Guerra Mundial, a batalha era outra. Ressurgia o liberalismo contra a crescente intervenção estatal. Os adversários eram dois: o comunismo e os keynesianos. Neste neoliberalismo dois nomes se destacaram: Friedrich Von Hayek e Milton Friedman (em diferentes espaços temporais).

O primeiro, na sua obra mais conhecida (Caminho para a Servidão), critica o socialismo por se imiscuir demasiado na vida privada dos cidadãos, afectando consequentemente determinadas liberdades individuais. Pelos relatos que nos chegam de países onde o socialismo é uma realidade, sabemos que é verdade. É a supremacia do Estado sob o indivíduo. (Mussolini não tinha uma frase parecida? “Tudo no Estado, nada contra o Estado, e nada fora do Estado”)

Já Friedman (Liberdade para Escolher é a sua principal obra) aponta baterias à burocracia estatal. O economista, que inspirou Reagan e Tatcher, reprova a lentidão e a corrupção existente na máquina do Estado. Não só nos regimes comunistas - onde a falta de diligência era tal que as pessoas tinham de esperar meses pelo arranjo de um simples electrodoméstico - mas também nos regimes de inspiração keynesiana, dado o exemplo dos entraves das agências reguladoras à economia e mesmo à sociedade (a burocracia da Food and Drug Administration – espécie de Infarmed e ASAE americana – que pelo seu excesso de zelo impede que medicamentos, como potencial para salvar vidas, entrem no mercado, é um exemplo). Nós apoiantes da intervenção estatal deviamos, por vezes, ouvir as criticas externas e reflectir.

Mas que se terá passado para o liberalismo se ter tornado tão odiado? A resposta é simples e não é nova. Foi pervertido. O liberalismo foi colonizado por indivíduos sem escrúpulos, para quem a liberdade económica só é boa se lhe encher os bolsos. São os mesmos que aplaudem a liberdade económica, mas correm a pedir auxílio estatal quando rebentam com um banco (Lehman Brothers ou…BPN). Quanto mais teremos um liberalismo parasitário. Friedman, Hayek e Smith seriam os primeiros a reprová-lo.

Não se fiquem a rir os marxistas. Ainda há algum que acredite que na URSS (and so on) se praticou a teoria utópica que Marx preconizou? Já agora, a própria Igreja aplica o cristianismo? Pois é. As coisas nunca são o que deveriam ser. Da teoria à prática vai um (enorme) passo de gigante.

sábado, 8 de setembro de 2012

Empreendedorismo: Uma palavra polémica (e não tem que ser)



É uma palavra que está na ordem do dia: empreendedorismo. Divinizada por uns, diabolizada por outros, parece não haver uma discussão na praça pública que atinja a sua essência. Sejamos sensatos. É impossível criar uma sociedade assente apenas no empreendedorismo. Para empreender é preciso uma mistura de força de vontade, talento e, arrisco-me a dizer, 90% de sorte.

Quem defende uma sociedade baseada apenas no empreendedorismo deve ter noção que quer uma utopia que degenerará em distopia. Passo a explicar: a sociedade não se pode virar apenas para aqueles que são empreendedores. Não nos podemos esquecer daqueles que não tiveram a sorte, ou o momentum para investir e empreender. Favorecer o igualitarismo radical é tanto um defeito da esquerda radical que renega qualquer tipo de iniciativa individual, como da direita que quer o empreendedorismo como paradigma social.

Agora, é perigoso rejeitar a evolução que a iniciativa individual (e em boa verdade o empreendedorismo) trouxe à sociedade. Um dos casos paradigmáticos e mais mediatizados nos últimos tempos é, precisamente, a Apple. Grande parte do sucesso desta empresa (e que agora é uma das mais cotadas a nível mundial) deve-se à inspiração (e sobretudo à transpiração) de um homem.

Steve Jobs passou por momentos atribulados, mas não desistiu. Despedido, não baixou os braços, regressou e tornou a Apple uma empresa bem-sucedida. Já disse atrás que não defendo o empreendedorismo como modelo social. A sustentabilidade não me parece real. Agora, é verdade que, a nível europeu, é preciso um maior incentivo aos empreendedores. Desengane-se quem pensa que isto passa por flexibilizações forçadas do mercado laboral.

Na Europa existe uma certa “criminalização” dos empreendedores falhados. Basta olhar para o mapa jurídico europeu. A revista Economist fez um levantamento do tempo que vai desde o fim do processo de liquidação de uma empresa até esta estar livre de dívidas. Por incrível que pareça, é nas maiores economias europeias (Alemanha e França) que o espaço temporal é maior. Se em França demora 9 anos, na Alemanha são necessários 7 anos.Esta revista também aponta a percentagem de empreendedores nos países europeus. Em Itália são 2,3%; na Alemanha 4,2% e na França 5,8%. Números bem inferiores a outros países, como os EUA (com 7,6%), a China (14%) e o Brasil (17%). O que se traduz no pequeníssimo número de empresas europeias bem-sucedidas. Desde 1976 até 2007, a Europa não chegou a criar mais de dez “big companies” com sucesso. Em igual período, nos EUA criaram-se mais de 20 empresas do género.

Quem defende a redistribuição da riqueza, tem que ter em mente uma coisa. Sem criação de riqueza, não haverá distribuição. E a sociedade tem que ajudar a criar um ambiente propício ao florescimento da iniciativa individual. Não estigmatizando quem falhou, mas elogiando por ter tentado. Por outro lado, os empreendedores têm que ter noção de que as condições que a sociedade (e o Estado sim!) lhes dá são essenciais para o sucesso. E devem tentar ao máximo retribuir.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Benefit Corporations: A Ética acima do Lucro


Toda a gente sabe que uma empresa é constituída por mais do que um CEO (presidente). Na verdade, através da compra de acções qualquer um de nós pode tomar parte da empresa. Tornamo-nos accionistas. Esta, dizem os mais acérrimos defensores do capitalismo, é uma das belezas do capitalismo. Podemos ser parte de uma empresa, mesmo sendo esta uma das maiores do país. É o sonho americano à distância de um shareholder.

E foi precisamente na América que surgiu a alerta para os males deste fenómeno. Se a distribuição de uma empresa por accionistas pretendia quebrar o fenómeno de o poder corporativo estar na mão de uma pessoa, também deu azo a algo mais: a ditadura do lucro. A verdade é que o CEO estabelece uma relação fiduciária com os accionistas. Este está encarregue de preservar os lucros da empresa, de forma a compensar o investimento dos donos das acções.

Mas isto nem sempre é positivo. Um série que tenho vindo a acompanhar chamada Newsroom foca precisamente este factor. Uma equipa jornalística decide fazer um noticiário que rompa com os padrões até aí estabelecidos. Para apresentar informação de qualidade, a equipa choca com um grande obstáculo: a queda de audiências. Em seguida vê-se pressionada para transmitir informação mais mastigável (infotainment). É a ditadura do lucro do accionista sobre o serviço público de qualidade.

Um caso mais real: se a BP prezasse as normas éticas, em vez do lucro puro e duro, teríamos tido um caso de derramamento petrolífero como aquele que tivemos no Golfo do México? É de duvidar.

Mas, sendo um país de contrastes e de contradições, é também dos EUA que nos chega um nova esperança. Falo das benefit corporations – empresas que são protegidas juridicamente por salvaguardarem interesses éticos, quando estes colidem com os de índole lucrativa. Tudo começou em 2010, no Estado de Maryland, mas já se alargou a outros dez estados norte-americanos. Uma vez criadas estas empresas comprometem-se a cumprir normas ambientais e socais.

Este novo estatuto empresarial pode ser uma “luzinha” no fundo do túnel. Num mundo em que as empresas estão tão desacreditadas e em que se julga que tudo o que é iniciativa privada é necessariamente mau, isto pode ser uma mudança de paradigma. Consciencializemo-nos de que não podemos travar a iniciativa privada. Quem o tentou (regimes comunistas) fracassou de forma lamentável. Contudo, também não podemos permitir que as empresas atropelem toda e qualquer norma em prol do lucro. Não é sustentável.

John Montgomery, advogado de negócios de Sillicon Valley e co-presidente do grupo de juristas que redigiu a lei a ser aplicada Califórnia estabelece dois cenários. “Tanto pode ser a vanguarda de uma mudança de paradigma como um movimento marginal, mas inclino-me para a primeira hipótese”, disse ao Financial Times. Por cá esperemos que tenha razão. É uma ideia demasiado boa para fracassar. E já agora: importem-na!

terça-feira, 4 de setembro de 2012

“Super-Mulheres”: as protagonistas do século XXI



Porque as generalizações conduzem a conclusões sem fundamento, começo por esclarecer que me debruço sobre uma realidade permeável a excepções. Ressalvo ainda que apenas pretendo o reconhecimento de quem corporiza o descrito e nunca desvalorizar quem não se revê.

Comecemos então a desvendar o paradigma feminino para o século XXI: líderes na esfera profissional, social e familiar (isto numa sociedade onde continuam a persistir obstáculos para a sua afirmação) eis que surgem as «Super-Mulheres».

As protagonistas são profissionais de sucesso, esposas (e amantes) dedicadas, mães exemplares e donas de casa irrepreensíveis. Social e culturalmente activas, têm ainda especial cuidado com a sua imagem. Porque o dia tem apenas vinte e quatro horas, conciliar tudo isto revela-se extraordinariamente difícil.

Dirão vocês que contam com ajuda. Digo-vos então que, ainda assim, a tarefa não fica facilitada. Os desafios que enfrentam diariamente representam um desmedido desgaste físico e psicológico. Ora vejamos:

A nível profissional, pelos cargos de grande responsabilidade que ocupam (muitas delas de chefia), deparam-se com a exigência de um universo empresarial onde não há lugar para fraquezas. Produtividade é a palavra de ordem.

Já a nível familiar os seus imperativos são educar os filhos e cuidar dos maridos. Para além disso, cumprem ainda as várias tarefas domésticas. Importa igualmente referir o implacável escrutínio a que estão sujeitas por parte de algumas mães e sogras.

Social e culturalmente activas, estas mulheres mantém-se diariamente informadas, têm presença assídua em eventos artísticos e culturais e ainda apoiam causas sociais. Destacando-se pelas suas convicções e qualidades, chegam mesmo a ser líderes de opinião em determinados círculos.

Dada a ditadura da imagem imposta pela sociedade, a «Super-Mulher» preenche ainda parte da sua agenda com uma série de rotinas em prol de uma imagem cuidada (ginásio, etc).

Com esta breve descrição percebemos que a resiliência é o suporte destas mulheres que assumem, com o compromisso e a exigência implícita, o poder em casa, no trabalho, na sociedade e na política.

Fica claro que esta mudança exige reajustamentos na mentalidade masculina. O homem tem agora de se adaptar à concorrência em espaços que outrora ocupou por "direito” e entregar o poder, partilhar o prazer e ajudar no cumprimento de funções que anteriormente se consideravam exclusivas às mulheres.

Porque em poucas décadas quebraram duras barreiras, é seguro afirmar que o século XXI será protagonizado por esses incompreensíveis e fascinantes seres - as mulheres.

domingo, 2 de setembro de 2012

Duarte Marques e os "mini-jobs": Mais precariedade ou uma grande confusão?


A proposta veio de Duarte Marques. O líder do PSD dos pequeninos (eu também me incluo na faixa etária por isso sinto-me no direito de gozar), veio fazer mais uma das suas propostas rocambolescas. O presidente da JSD veio propor a criação de mini-jobs para universitários e desempregados.

Seria, à primeira vista, uma opção interessante, não tivesse Duarte Marques apresentado esta proposta com nove anos de atraso. Sim, este modelo do “mini-job” já é aplicado na Alemanha desde 2003. Como se tem saída? Não muito bem, parece. O “mini-job” cada vez mais é considerado uma forma de precariedade onde (na Alemanha) se ganha 400 € por mês. Ou seja, o “mini-jobber” acaba por ser uma dádiva para o empregador que paga consideravelmente menos por hora do que a um trabalhador normal. Concorrendo em desigualdade, o trabalhador regular verá o seu salário diminuído. Isto se não se quiser converter noutro “mini-jobber”. É mais um capítulo da corrida à precariedade laboral. Qual é o resultado disto (e de outras políticas salariais) na toda-poderosa Alemanha? Desigualdades sociais.

Agora exportemos este modelo para Portugal? Ficam algumas perguntas. Qual seria a remuneração? Poderiam os trabalhadores descontar para a Segurança Social? (na Alemanha descontam qualquer coisa como 3 euros (!) por ano de trabalho) Qual seria a carga horária?

Claro que estes mini-jobs dariam uma grande ajuda política. Com o desemprego a roçar o pico dos 16%, nada como uns trabalhitos (ou em bom português “biscates” legais) para diminuir este número que assombra a popularidade do governo. E depois há outro “nonsense”. Duarte Marques diz querer implementar os “biscates legais”, como forma de por um travão na economia paralela. Sucede que estes “trabalhos” não terão o peso da “carga burocrática e fiscal”. Não é isto que sucede com a economia paralela? Um dos grandes males desta não é não contribuir (directamente) para a economia? É esta a geração com futuro prometida? (ver imagem) Estou confuso, Duarte.

 
O Talho da Esquina © 2012