terça-feira, 14 de agosto de 2012

Crise: Altura de repensar o memorando?






Já faz mais de um ano que nasceu e ainda não encontrou pai. O memorando da Troika, ora é aceite pelos partidos que o assinaram, ora quase que é rejeitado por estes. Os partidos da esquerda radical recusaram sentar-se à mesa com os representantes das três entidades que coordenam o triunvirato. Atitude compreensível, dado o posicionamento ideológico, mas criticável visto que ao assumirem esta posição sectária, não puderam negociar ou sequer apresentar ideias aos representantes do FMI, BCE e Comissão Europeia.


Hoje, passado mais de um ano, o memorando encontra-se sobre forte contestação. Se é verdade que os juros da dívida a curto prazo baixaram de forma significativa, não é menos verdade que isto se deve mais às intervenções orais de Mario Draghi do que propriamente a acções concretas de Vítor Gaspar. O governo, apelidado nos meios internacionais de “bom aluno”, tudo tem feito para merecer este título. As reformas pedidas pela Troika tem sido implementadas. A questão é: a que custo? Os indicadores económicos não se mostram favoráveis e nada aponta para que haja um “milagre português”. Se a meta do défice dificilmente será atingida, o número de desempregados também não é abonatório das políticas governamentais. Os próprios indicadores do PIB apontam para um cenário pouco favorável. A economia recuou 3,3%, a maior queda face a período homólogo (trimestre anterior), desde 2009. Isto para não falar da queda do consumo interno que, por mais que se invista nas exportações, ainda é o mercado primordial da maioria das PME´s nacionais.


Por isso, e face à conjuntura macroeconómica internacional – iminente resgate a Espanha e Itália (?) e abrandamento das maiores economias mundias (China e EUA) – importa, mais do que nunca, saber que destino dar ao memorando. Sabemos que a ideologia de Passos Coelho o impele a construir um estado liberal (economicamente falando). Não vou discutir as supostas vantagens e desvantagens deste projecto. Apenas ressalvo que o mesmo já foi tentado anteriormente. Passos não é um pioneiro. No Chile, o general Pinochet tentou e de facto conseguiu instituir liberdade económica no seu país. Apesar de terem havido melhorias económicas o facto é que, quando a poeiro assentou, as coisas não pareceram tão brilhantes. Em 1990, altura da democratização 38,6% da população chilena estava abaixo do limiar da pobreza e 39% não tinha segurança social (que Pinochet privatizou).


Agora, o que importa saber é se Passos está disposto a pegar no seu memorando, fazer das tripas coração e continuar a instituir as suas reformas, mesmo debaixo da mais forte tempestade económica. Não será altura de Passos, do alto da sua voz de tenor, usar a sensatez e parar para pensar que o caminho escolhido não está a colher os frutos esperados. Talvez uma renegociação do memorando, nomeadamente nos seus prazos e juros fosse desejável. Também rever algumas medidas é importante. Mas para isso, Passos Coelho tem de deixar de parte o sonho de um “milagre alemão” praticado em Portugal. Se na altura, nos princípios da década 2000, os germânicos recuperaram economicamente, com base em reformas estruturais, não foi menos importante a expansão de crédito nos países periféricos que permitiram o “boom” das exportações alemãs. Afinal, torna-se irónico. Os alemães, agora tão hayekianos, usufruíram das políticas de investimento tão próprias dos seguidores de Keynes. Afinal, a crítica deste economista britânico ao seu homólogo austríaco é conhecida. Se todos – famílias, empresas e governos – começarem a tentar aumentar as suas poupanças ao mesmo tempo, não há forma de evitar que a economia caia até que as pessoas sejam demasiado pobres para poupar.

Por isso, Passos tem que entender três coisas. Portugal não é a Alemanha, 2012 não é 2000 e o memorando da Troika não é um livro de magia e de soluções milagrosas.

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